Bonito, heim!
É o que minha mãe diria se fosse a Bonito a turismo. Veja por quê.
Tenho uma dica de férias sensacional para você. Um lugar repleto de rios cristalinos, cavernas e cachoeiras, onde você pode se banhar e observar os peixes coloridos, tudo ao redor de uma cidadezinha simpática com pousadas e restaurantes.
Ops… Parece com outros duzentos destinos pelo Brasil, que você já esteve, com as mesmas atrações? Calma… tem diferenciais que já vou te explicar.
Primeiro, dirija mais de mil quilômetros de qualquer capital do país, exceto se você mora em Campo Grande. Aí são trezentos quilômetros de estrada, mas nesse caso você não precisaria ir, porque você encontraria as mesmas atrações, bem mais próximo da cidade.
Em seguida, deve enfrentar alguns perrengues, de resto incomuns nos outros cento e. noventa e nove outros destinos. Depois de dois dias viajando finalmente cheguei a Bonito, parando direto na pousada que reservei. Nos cinco minutos que durou o registro na. pousada Muito Bonito, já me cobravam quarenta reais extras para aceitar meu pequeno cão, mais cinquenta reais por uma cama de casal. Segundo eles o Booking reservara cama de solteiro. Fiquei pensando quem viaja para tão longe. para ficar no fim do mundo… sozinho? Bonito não me parece um destino com baladas onde encontrar sua cara metade, mas enfim.
Não que a taxa cobrada para hospedar o cão desse a ele passe livre na pousada, nem pensar. Por diversas vezes fui alertado para prendê-lo para que não andasse pela pousada cuja diária ele também pagou!
E pagar é a regra aqui. Já no primeiro dia você se depara com um cardápio infindável de atrações. Pode-se flutuar no rio, visitar cachoeiras e entrar em cavernas, cada um deles pelo preço de entrada num parque da Disney. Sem que o Mickey esteja te esperando lá dentro. Pelo preço do ingresso você imagina que a água do rio é aquecida ou a caverna perfumada, mas o que encontra são o bom e velho borrachudo e água fria, como em qualquer outro lugar do mundo que não cobra nada pela… natureza.
Num tal de Aquário de Bonito você pode olhar peixes e arraias numa piscina, pelo preço de um almoço! Almoço de restaurante, não um PF, bem entendido. Os balneários são lindos, graças à mãe natureza, e bem cuidados, graças aos funcionários. Esses, às dezenas, e na falta de outras tarefas já que o lugar inspira apenas contemplação, incumbem-se de te aporrinhar, a cada cinco minutos, com o que as placas já dizem. Proibido garrafas, proibido alimentar os animais, proibido estacionar aí, proibido pular no rio, proibido pet, proibido proibir. E olha que não há pouca placa sinalizando isso tudo, tantas que chegam a bloquear a tal contemplação.
Além de um regimento de funcionários repressores, os balneários têm seus restaurantes. Num desses, o do Sol, almoçamos pelo preço de duas refeições na cidade, e um copo com gelo e limão para acompanhar o refrigerante aumentou seu preço em 20%. Isso mesmo, um copo com gelo e limão, pedida tão comum quanto gratuita em qualquer lugar fora de Bonito.
Acréscimo semelhante, só que no preço da refeição toda, sofremos ao pedir pirão extra numa moqueca acompanhada de nada menos do que … um pires de pirão. Afinal, longe de essencial numa moqueca, o pirão é apenas um desprezível acompanhamento. Ou não? Seria de propósito, para ensejar o pedido extra? Foi, claro, num dos restaurantes da rua principal, o Aquário.
Na pousada seguinte, a Arizona, cheguei na parte da tarde para me registrar. Antes mesmo do boa tarde ou seja bem-vindo, já ouvi um “cachorro não pode ficar solto!” Isso porque a pousada é uma das poucas que aceitam pet (até mudei de pet-friendly pra pet-tolerant) E antes de verificar que a Zuppy é um border collie treinado, limpo, silencioso e que caminha junto com o dono. Ah, e com outros dez cachorros indisciplinados da cidade rondando a recepção!
O pet é um caso à parte. A região toda em volta de Bonito celebra a vida animal. Mas não a do seu animal! Desprezando o fato natural de que a natureza não separa cães e gatos de animais ditos selvagens, os humanos locais não permitem que, numa área de rio a 15 km da cidade, com espaço suficiente para um rebanho de duzentas cabeças de gado, o cãozinho possa sequer descer do carro! Isso depois de você pagar, adiantado, duzentos reais por cabeça para… flutuar no rio.
O custo assusta qualquer um, menos os inúmeros e incautos estrangeiros que visitam a cidade esperando encontrar somente aqui o que na verdade se vê aos montes no sul de Minas Gerais, interior de Sao Paulo, no Nordeste, no Jalapão, nos Lençóis Maranhenses, nas dezenas de Chapadas pelo Brasil todo. Ah, e nesses outros cento e noventa e nove destinos, por “dérreal” a entrada, quando não de graça!
Se você já visita esses lugares normalmente sem precisar se deslocar mil quilômetros, saiba que não há nada que justifique sequer trezentos. Se você está de férias e bem de grana, vai pra Disney. Mas se estiver bem de grana mesmo, abastado, então pode ir a Bonito! Talvez você nem ligue pra exploração ostensiva do turista e a ganância dos bonitenses.
E como dizia minha mãe, Boniiiiiiiito, heim?
PS: Pra ser justo, tem lugares bons em Bonito. Pra comer e se hospedar, bem entendido. O destaque é o Juanita, restaurante de primeiríssima cozinha, pratos deliciosos, preços compatíveis com a quantidade servida e atendimento que te faz se sentir em casa (a propósito, porção de pirão extra servida assim que a sua acaba, sem custo adicional). Já o Arizona é uma boa pousada, mas até lá, ovos mexidos no café da manhã só pagando extra.
